Rodrigo Aragão tem por tradição em sua filmografia trabalhar com monstros, sendo responsável pela criação do visual das criaturas. Muitos deles são trazidos do folclore brasileiro ou então passam por uma repaginação para se adaptar às narrativas compostas nos ambientes brasileiros como citei na parte 1 desta retrospectiva.
Em 2008 o diretor lançou seu primeiro longa-metragem, intitulado como Mangue Negro o longa conseguiu ter bastante reconhecimento dentre a comunidade de fãs do gênero horror. O primeiro item que salta aos olhos, é o fato de ser um filme brasileiro sobre zumbis, um tema que foi pouco explorado na cinematografia nacional. É interessante ver como ele adiciona esta criatura ao ambiente que dá nome ao filme, o mangue. Os moradores locais começam a ficar doentes após a contaminação do mangue e consequentemente dos peixes e crustáceos que viviam no local e serviam de alimentação. Logo no primeiro filme é possível perceber a preocupação temática em tecer uma crítica, neste caso a exploração insustentável de ecossistemas por grandes empresas e a falta de empatia com a população mais pobre que depende dele para sobreviver.
A narrativa do filme pode parecer um pouco confusa no início por alternar entre diversos personagens, mas logo Luís da Machadinha interpretado por Walderrama dos Santos toma o protagonismo para si, junto de seu interesse amoroso Raquel, interpretada por Kika de Oliveira. O filme chama a atenção pela construção do ambiente que cerca os personagens principais, como as cabanas de madeira e a atenção aos detalhes que referem-se a decoração das casas que refletem os dia a dia daqueles personagens.
Dois personagens que eu particularmente gosto muito são o Agenor dos Santos, interpretado por Markus Konká, um pescador contador de história mas que conhece todo o mangue e a D. Benedita, interpretada por André Lobo, uma benzedeira que faz remédios e conhece as receitas para qualquer enfermidade, além de parecer ser a única do local que sabe a verdade sobre o que está acontecendo, muito por causa de sua vivência. Pessoalmente a D. Benedita ganha ainda mais personalidade por estar sempre oferecendo uma “sopinha de taioba” para os protagonistas.
Os zumbis mostram o esmero de Rodrigo Aragão quanto à criação de universos fantásticos e o amor que o diretor tem pelo que faz, pois, tanto a maquiagem quanto os mecatrônicos são impressionantes, e a obra se destaca por ter sido feita apenas com R$ 65.000,00, denotando como o cinema é um trabalho coletivo e o exercício da criatividade para contar uma história deve ser a principal ferramenta de um diretor.
Falando em arte coletiva grande parte do elenco dos filmes de Aragão, se repetem durante a sua filmografia, não sendo diferente em A Noite do Chupacabras lançado em 2011. O filme trata-se da rivalidade entre duas famílias, que são inimigas por causa de uma disputa de terras, a situação fica mais grave após uma criatura atacar ambas as propriedades e a guerra entre as duas voltar com mais força ainda após uma trégua, desta vez a luta é ainda mais sangrenta, o que torna o Chupacabras ainda mais violento.
É importante ressaltar que este filme possui uma criatura totalmente brasileira, criada a partir de lendas urbanas e contos populares, e o diretor pôde criar do zero sua aparência. O roteiro é um pouco mais complexo que o de seu filme anterior e o escopo maior, com cenas de tiroteio e ação, inspiradas no melhor da mistura entre horror e western.
Este filme é um pouco menos sério que Mangue Negro, trazendo um humor macabro através do exagero na representação da violência e da relação entre personagens. Outro fator importante é sobre a adição de Joel Caetano, que viria a ser o assistente de direção de Rodrigo Aragão em seus próximos filmes, como um dos protagonistas do filme, Douglas da Silva. Também temos a participação especial do diretor Petter Baiestorf, da Canibal Filmes, como Ivan Carvalho, líder da família antagonista do longa. Para finalizar, o roteiro do filme ainda adiciona outra criatura das lendas urbanas, aqui chamado de Velho do Saco, interpretado por Cristian Verardi.
Este é o fim da parte 2 da Retrospectiva da Filmografia de Rodrigo Aragão como parte da cobertura da décima edição do Cinefantasy. Venha conferir a terceira e última parte que será lançada na sexta-feira!