Heverton Lima*

Conhecida por reinventar o cinema de horror na década de 80, a franquia ‘Evil Dead’ (‘Uma Noite Alucinante’), voltou às telas este ano com um novo filme desde o último, em 2013, estrelado por Jane Levy e com a direção de Fede Alvarez. Dessa vez sob o comando do diretor Lee Cronin e com Alyssa Sutherland e Lily Sullivan no protagonismo, apesar de trazer na produção Sam Raimi e Bruce Campbell, idealizadores da história, parece que aqui a produção esquece o que a fez ser tão famosa e nos leva a levantar o seguinte questionamento: será o começo do esgotamento de mais uma franquia no cinema?

Em 1980 dois amigos tinham exatamente uma ideia e um sonho. Foi nesse ano que Sam Raimi junto a Bruce Campbell saíram procurando qualquer pessoa interessada em embarcar e apoiar a realização da mesma. Com a ajuda de familiares, amigos e um investidor local, eles conseguiram levantar o suficiente para produzir o que viria a se tornar um dos maiores clássicos do terror, e levaria os dois companheiros de longa data juntos ao estrelato e à aclamação – tanto da crítica quanto do público geral. E o destaque dessa produção, lançada no ano seguinte, em 1981, se deu exatamente pela inovação que ela trouxe para o gênero na época. Apesar dos baixos recursos disponíveis, a equipe técnica usou toda a sua criatividade e entregou técnicas muito bem trabalhadas que influenciaram na fama do filme através dos anos. Elas resultaram em efeitos práticos surpreendentes para a época criando uma atmosfera muito importante para a narrativa funcionar com o público. Do uso de maquiagem, a stop motion e efeitos de câmera, todos esses elementos colocaram o projeto em evidência. Algo impossível de não lembrar são as cenas em que os cipós se movimentam. A equipe criou um braço mecânico que permitia simular que os cipós atacavam os personagens. Com uma boa edição e um estudo de cortes de câmera eficientes foi possível fazer isso com maestria, dando uma movimentação realista aos cipós.

O sucesso que esse conjunto de elementos no longa atraiu lhe garantiu ainda mais duas sequências, lançadas em  1987 e 1992, um remake em 2013, uma série de tv – produzida entre 2015 até 2018 – e, recentemente, uma quarta sequência dos originais. “Evil Dead Rise” (ou A Morte do Demônio: A Ascensão, no Brasil) foi lançado nos cinemas em abril deste ano e a história agora se passa em um apartamento no meio da cidade. Quando, após um terremoto, Danny (Morgan Davies) – o filho mais velho de Ellie (Alyssa Sutherland) – acha uma passagem para uma espécie de câmara escondida, ele encontra lá um dos três volumes do Necronomicon, livro dos mortos e o leva para o seu apartamento. Junto ao livro haviam alguns discos e assim que uma força invisível os coloca para tocar, o livro reage ao áudio e libera um demônio que possui Ellie. A partir disso começa uma noite de sobrevivência e possessões características da história. É definitivamente um filme que não tem medo de fazer com que seus personagens morram das formas mais brutais. É do consciente do espectador torcer para que as coisas deem certo vendo um ambiente familiar, com crianças, mas a produção não hesita e nos mostra que ninguém está a salvo de um demônio sedento por almas, caos e sangue. Apesar disso, infelizmente, parece que aqui esqueceram o que fez com que Evil Dead seja tão famoso. 

Um fenômeno que acontece com franquias cinematográficas é o enfraquecimento das mesmas e isso é algo que podemos notar neste filme. Não dizendo que ele é inteiramente responsável pelo enfraquecimento desta em específico sozinho, mas que a produção pode ser o começo de uma saturação da história. Os fãs querem sim continuar acompanhando um grupo de pessoas tentando sobreviver aos deadites e saber onde algum dos três volumes do livro dos mortos pode aparecer, mas cabe à questões de produção alimentar ainda mais esse interesse. Dentre alguns teóricos que realizaram estudos sobre cinema e mídia e analisaram o comportamento de franquias na indústria,  como Robert Thompson, Henry Jenkins e Derek Johnson, podemos discutir a partir de um ponto específico entre os três: para uma franquia de sucesso é necessário, além da inovação, certa criatividade na manutenção do interesse do público. E se tratando de inovação, como já dito, as versões anteriores desde as originais e o último remake chamaram atenção pelos seus diferenciais. Na versão de 81 são os efeitos práticos, na de 87 – que pode ter superado seu antecessor – destacam-se o humor acrescentado na história, o que lhe rendeu elogios de respeitados críticos de cinema, na de 2013 podemos ver um filme maduro e muito bem direcionado, mas é difícil pontuar algo que tenha se destacado o suficiente no atual. Soa preguiçosa a escolha de usar computação gráfica para movimentar os cabos do elevador na cena de possessão de Ellie e o orçamento não é uma desculpa para isso também. A escolha de vários planos através do olho mágico da porta do apartamento pode parecer criativa, mas não é a melhor forma de mostrar o que acontece no corredor do prédio, esteticamente falando. Se fossemos rankear os filmes, analisando todos, esse seria menos interessante, ainda que Uma Noite Alucinante 3 não seja tão querido entre os fãs. Mas apesar disso, o terceiro filme da franquia original ainda entrega criatividade e faz homenagens à técnica de stop motion. 

Analisando alguns desses pontos citados, Evil Dead Rise até se apresenta como um filme assistível, mas não parece fazer jus aos seus antecessores. Mesmo com a quantidade absurda de litros de sangue (mais de 6.000 litros), com homenagens a famosas produções como ‘O Iluminado’, vemos que é um longa que tenta, mas não consegue chegar lá. Cabe, no futuro, uma maior análise do que o público fiel espera e, além disso, procurar formas de trazer elementos estéticos novos para um universo tão rico, que chamem atenção, caso contrário, ao revisitarmos este, poderemos definir um ponto exato sobre onde a franquia se tornou vazia e perdeu o prestígio que um dia já teve. A sua importância para o cinema de gênero não será apagada, mas é importante que tenha ciência do quanto e de como pode se manter longínqua. 

 

*Me chamo Heverton Lima, moro em Pelotas/RS. Atualmente estudo Cinema e Audiovisual e sempre me interessei pelo cinema de gênero e, também, pela escrita. O amor por filmes de terror vem de um lugar de memória afetiva, eram os filmes que minha mãe amava e assistíamos sozinhos quando meu pai ia trabalhar. Pretendo me formar em Cinema e logo depois em Jornalismo e, assim melhorar ainda mais a forma que escrevo e trabalhar com crítica de cinema.