Diego Stevan Lopez* Muitas pessoas conhecem Stephen King por seus trabalhos mais voltados aos horrores dos subgêneros clássicos, e é inegável que o escritor goza de talento, principalmente, quando o assunto é entreter as massas sobre os mistérios e perigos de um mundo para além do conhecido e cientificamente validado. Este ensaio, no entanto, vai…
Lidar com a morte e com o fim em “Conta comigo”
Ygor Pires Monteiro* Por muito tempo, Stephen King foi associado exclusivamente ao terror. Contos, romances e filmes pareciam vir apenas desse gênero. Títulos como “Carrie, a estranha”, “It: A coisa”, e “Cemitério” eram sempre resgatados para tentar justificar essa percepção. Tempos depois, a diversidade da obra do autor passou a ser mais reconhecida, tendo dramas…
Editorial #2
Stephen King é uma referencia para todas as pessoas que gostam de horror. Seja na literatura, onde sua obra é uma das mais extensas, seja no cinema que adaptou boa parte dos escritos. Deste modo, não poderíamos deixar de fazer uma edição da revista sobre este que talvez seja o maior nome do horror vivo….
Os sons do medo
Ligia H. Villon*
Eu poderia começar de muitas formas a falar sobre esse tema, mas como alguém que não é crítica e sim técnica de cinema eu vou começar com a chuva. Sim, a chuva. Você que está lendo agora este texto já reparou que nos filmes de terror os raios e os trovões caiem ao mesmo tempo? Mas, que na vida real isso não é possível porque existe um pequeno delay entre eles, afinal a velocidade da luz é mais rápida do que a do som? Não? Interessante.
Bem, isso ocorre porque é uma convenção entre nós de pós-produção de som, desde que o som começou a ser inserido aos filmes, que certos efeitos, como o som do trovão causam medo. O trovão é um som grave que é mixado nas caixas subwoofer, sons graves e que surgem do nada geram medo em mamíferos, ou seja, nós.
Bem, eu poderia então citar todas as cenas, de todos os filmes com chuva do Stephen King aqui, né? It – A Coisa, A Espera de Um Milagre, Cemitério Maldito, etc.. Mas seria sem graça, pois outras coisas que usamos para dar medo além dos efeitos são as trilhas sonoras e foleys.
Trilhas em filmes de terror podem ser extremamente marcantes, mas a maioria dos filmes do Stephen King não tem um tema forte, como por exemplo, Psicose. Deixo aqui duas exceções, as duas adaptações de “Chamas da Vingança” que tem as trilhas de autoria de John Carpenter e “Um sonho de liberdade” (1995) que concorreu ao Oscar nessa categoria.
Isso nos deixa com os foleys. Foleys tem esse nome em homenagem ao radialista que percebeu que faltava algo aos sons dos filmes, ele então adicionou as técnicas de radionovelas à pós-produção. Dentro dos foleys temos as munhas, que são todos os sons de algo que é tocado por mãos. Os sons de objetos em geral. E, o mais importante aqui os drones. São sons que estão entre efeitos e trilha e são muito usados e filmes de terror em geral. Todos os filmes de King tem alguma variação de drone.
E em IT – A Coisa (2017), toda a vez que o palhaço aparece um drone mixado com uma risada estrada aparece. Além disso, o filme utiliza muito o “efeito trovão”. Sons graves para te assustar quando você não está preparado.
O último aspecto que é o mestre do medo na edição de som é o não som. Sim, o silêncio. O silêncio assim como o trovão junto com o raio, não é natural, e tudo que não é natural, incomoda, gera desconforto, e dá medo.
Momentos silenciosos, aonde o som vai aos poucos ficando mais auto e terminam num pico muito agudo de um drone bem assustador normalmente significam que, ou mostro, ou fantasma, ou assassino está bem perto do protagonista esperando para dar o bote.
Esse efeito é exatamente o oposto do “efeito trovão”, pois você está avisando o seu expectador, vai acontecer algo ruim através do som. “Vai acontecer algo ruim, você não está vendo, o personagem não está vendo, mas você sabe mesmo assim”. É o efeito cauda escorpião do som. Próxima vez que assistir a um filme de terror feche os olhos e só escute e tente perceber, quando o será o próximo susto.
Um filme que trabalha muito com o silêncio até para mostrar o isolamento que os personagens se encontram é O Iluminado (1980). Na cena em que o Danny está andando de bicicleta enquanto o pai está na maquina de escrever quase não som apenas os da bicicleta e da máquina. A falta dos demais sons ambientes além de mostrar o isolamento gera desconforto, o que por sinal precede a ocorrência de fantasmas.
O silêncio também aparece na cena no filme Carrie, A Estranha (1976), logo depois que o balde de sangue cai em cima dela e os colegas começam a rir, não ouvimos os risos só vemos, apenas depois de ouvir a voz da mãe dela em sua memória é que ouvimos o som das risadas. Assim que o som volta vem à fúria Carrie, seguida por drones e efeitos bem agudos.
Eu falei do som quando muito, o “efeito trovão”, de o som completar, o drone, e do efeito do silêncio. Mas só isso é bastante para criar um ambiente sonoro de horror e terror? A resposta é não. Existem ainda as três níveis de edição de som. Naturalistas, subjetivo e aditivo.
Naturalista, todos os filmes usam e significa trazer verossimilhança ao filme. Em filmes de terror o nível naturalista é deixado de lado ás vezes. Subjetivo, significa que você quer usar a sua edição de som para mostrar que está dentro da cabeça do personagem, como num sonho, lembrança, alucinação ou visão, por exemplo, a cena da Carrie no baile escutando a voz da mãe.
E por último, e talvez o mais importante, o aditivo, que significa 1+1=3. Em edição quando você coloca uma imagem ela tem um valor, adicione um som e ele sozinho tem outro valor, os dois juntos formaram um terceiro valor totalmente novo.
Um exemplo prático disso é IT – a Coisa, a figura palhaço tem um significado, você pode ter medo sim ou não, o mesmo serve para o balão vermelho, mas se eu adicionar um drone assustador para qualquer uma dessas imagens, aí sim terá o valor terror.
Para finalizar, eu vou falar da cena que talvez mais me marque com som de trovão em um filme de adaptação do autor: Um Sonho de Liberdade (1994). Que não é um filme de terror. Na cena da fuga, a construção da sequência é toda uma narração em voz off e a chuva, que aqui não dá medo, muito menos o trovão. Pois o personagem se utiliza justamente do delay entre raio e trovão para fazer o buraco no cano para sua liberdade. Mas existe uma tensão tão grande e tão bem construída, que só o cinema quebrando as regras da física é capaz de fazer. Depois que ele sai os raios e trovões caiem juntos, sempre longe, na prisão, e sobe a trilha. Ou seja, o maior monstro em todas as obras de Stephen King sempre serão as pessoas.
* Meu nome é Lígia Helena Villon, São Bernardo do Campo – SP, sou formada em Cinema Digital e animação. Sou cineasta, roteirista, quadrinista e escritora. Além disso, Coprodutora no coletivo independente Alguma Coisa Filmes, colaboradora do Coletivo Quadrinhos do Mundo e da página Mulheres Audiovisual, cineasta independente, dirigi 6 curtas e um média metragem. Possuo história publicada pela editora Skript no quadrinho Pândega com mais outros artistas que foi ilustrada por Mazure Moganashi entre outras colaborações.
Um passeio por Stephen King
Danielle Delaneli*
Um dos motivos para Stephen King fazer tanto sucesso é sua capacidade de transformar o que é sobrenatural em realidade, mesmo com o autor deixando claro que o horror é ficcional. Impressiona o fato de sua obra atravessar gerações e conseguir ser atual e relevante. Tal sucesso deve-se a sua habilidade de compreender a mente humana e propor uma reflexão sobre a complexidade dessa mente atormentada.
O horror é uma ferramenta usada por King para explorar outros aspectos emocionais dos personagens. Através de histórias intensas que exploram medos e angústias, cria-se uma identificação no leitor fazendo com que este leitor viaje por diferentes emoções dentro de uma mesma história.
Com uma obra imagética não foi difícil atrair cineastas interessados em adaptar suas obras para o cinema. Com isso suas histórias tornaram-se mais conhecidas pelo grande público, o que o torna um sucesso literário e também cinematográfico.
Uma bibliografia de sucesso que tornou-se uma filmografia igualmente bem-sucedida inclui O Iluminado, It: A Coisa, Carrie, Louca Obsessão, A Torre Negra, Christine, O Carro Assassino entre muitas outras obras que impactaram a cultura pop ao longo dos anos. Além desses e outras dezenas de romances, Stephen King é autor de centenas de contos de sucesso.
Com uma grande quantidade de adaptações de suas obras para as telonas, o sucesso de King foi aumentando. O que prova que a literatura é uma excelente porta de entrada para o cinema, e este, uma bela vitrine para obras literárias principalmente quando são de qualidade como as do autor.
Uma particularidade das obras de Stephen King é trazer o sobrenatural como acessório para abordar temas sociais.
Em O Iluminado, por exemplo, temos uma abordagem do alcoolismo que gera uma crise familiar. É uma obra sobre um bloqueio de autor que trata também da loucura. Jack Torrence é um homem que sonhava ser escritor mas é medíocre e acaba tornando-se frustrado e caindo no alcoolismo. Mais tarde passa a culpar a própria família por seu fracasso, isolando-se dentro do isolamento do hotel para tentar escrever. Com o tempo passa a ter um comportamento abusivo e mergulha por vontade própria na loucura. E quanto mais percebe sua falta de talento, mais mergulha na loucura e se afasta da família. Tal atitude, que é uma escolha do personagem, somada ao sobrenatural acabam sendo gatilhos para a insanidade que podemos encarar como uma fuga da realidade.
O perigo representado por Jack Torrence é também a alegoria de uma mente entrando em colapso, ou seja, quanto mais ameaçador ele fica, mais a mente se perde.
E se nessa obra temos o isolamento de um escritor frustrado e consumido pelo fracasso, em Misery temos uma leitora que vive isolada tendo como único sentido na vida acompanhar a trajetória de sua personagem favorita, que dá título à obra.
A solitária Annie Wilkes tem em Misery uma fiel companheira até que, ao socorrer o criador de sua personagem favorita, tem uma grande decepção: ele pretende matá-la. A loucura de Annie, tal como a de Jack, vai crescendo, tomando conta dela e interferindo em sua vida. Aliás, no caso de Annie também é retratada a obsessão.
Enquanto em “O Iluminado” temos a impossibilidade de encarar a realidade na figura de Jack, em Misery temos a representação da obsessão que leva à loucura. Essa obsessão pode ser entendida como alegoria da busca excessiva pelo sonho americano a qualquer preço. Sonho que, no caso de Jack não foi alcançado, fazendo com que se enterrasse no isolamento. Obsessão que impede Annie de se despedir de uma personagem, representando a dificuldade que algumas pessoas têm de seguir em frente.
Até aqui vemos apenas questões da vida adulta. Porém, King também aborda a juventude em suas obras.
Em It – A Coisa vemos crianças abandonadas à própria sorte, visto que poucos adultos aparecem e, quando isso acontece, demonstram certa hostilidade. Ou seja, negligência e abuso.
Em Christine, o Carro Assassino podemos acompanhar a relação do jovem com o primeiro carro.
Em Carrie temos a representação de momentos importantes na vida de uma jovem como a primeira menstruação e o baile de formatura.
Qual a relação entre as três histórias? Uma fase de experiências pessoais importantes para o crescimento e construção da autoestima.
Carrie tem ainda em comum com O nevoeiro o fanatismo religioso que pode arruinar o amor-próprio de uma jovem ou tirar a vida de um inocente.
Há ainda a relação com a morte abordada em Cemitério maldito (O cemitério). Na verdade a não aceitação da perda, o processo de luto e como lidar com a dor são o grande conflito da história.
Temas sociais não faltam, pois King sempre usa dramas pessoais para produzir medo.
*Danielle Delaneli é professora, atriz, escritora, roteirista e produtora. Formada em Letras pela Universidade Estácio de Sá. Pós-graduada em Cinema e a linguagem audiovisual pelo Instituto Graduarte e em Jornalismo pela Faculdade Faveni.
Muito criativa, desde criança gosta muito de escrever. Tudo graças à sua mãe, responsável por suas maiores paixões: Literatura, Teatro e Cinema que hoje tornaram-se também seu trabalho, e seu pai que sempre a incentivou a estudar para alcançar seus objetivos.
O estigma cigano em Stephen King
Giovanna Venturini*
Considerado por muitos um dos grandes mestres do terror, Stephen King lançou seu livro Thinner (traduzido no Brasil como “A maldição do cigano”) em 1984 sob o pseudônimo de Richard Bachman. Na história, Bill Halleck é um advogado obeso que acidentalmente atropela e mata uma idosa cigana, mas que acaba saindo impune — graças à conivência do juiz e do chefe de polícia local. Quando Halleck sai do tribunal, um velho cigano de nariz carcomido toca seu rosto e diz: “mais magro”. A partir deste ponto, o advogado começa a perder peso vertiginosamente e de forma incontrolável. Assim, a trama acompanha Bill em sua corrida contra o tempo, buscando uma forma de encontrar o cigano e anular a maldição antes de emagrecer ao ponto de desaparecer completamente. Aqui cabe um aviso: este ensaio contém spoilers do livro.
Apesar de Thinner se tratar de uma obra de ficção, sua narrativa traz temas pertinentes que encontram ecos no mundo real: vingança, justiça, alteridade, estigma… são assuntos que se entrelaçam na trama, usando como fio condutor uma maldição. A escolha da identidade étnica dos personagens tampouco se dá por acaso: a própria ideia da maldição em questão — e de quem a realiza — está diretamente atrelada ao estereótipo enraizado de que o povo cigano (também chamado de Roma ou Romani) estaria ligado à feitiçaria.
Contudo, esta é apenas uma das várias ideias preconcebidas a respeito do povo Roma que constituem o imaginário não-cigano (gadjé). No próprio livro em questão, esta não é a única manifestação do estigma cigano: em diversos momentos, King narra através de seus personagens uma história de marginalização envolvendo este povo — ilustrando como os ciganos são vistos ao mesmo tempo com temor e fascínio.
De forma geral, a estigmatização do povo Romani costuma perpassar estas esferas: vivem à margem da sociedade e são vistos como ladrões, feiticeiros e boêmios, mas ao mesmo tempo compõem um imaginário ligado a mistério e liberdade. Essa presença dos ciganos na história e a forma como as tensões se apresentam entre grupos distintos nos permitem analisar Thinner sob a ótica do autor Erving Goffman, especialmente através do seu conceito de estigma.
Inicialmente, Goffman resume o conceito de estigma como “a situação do indivíduo que está inabilitado para a aceitação social plena” (GOFFMAN, 1980, p. 7). É interessante ressaltar o termo “situação” nessa definição para entendermos uma característica essencial do estigma: ele não é absoluto. Na teoria de Erving Goffman, trata-se de um atributo profundamente depreciativo, mas que só faz sentido se analisado dentro de um conjunto de relações. Assim, o estigma não existe no vácuo: se forma no encontro, no manejo da tensão entre os “normais” e os estigmatizados.
Estas duas últimas categorias podem ser vistas na narrativa através da constante dualidade entre os “bons sujeitos” e aqueles que estão na margem — especialmente os ciganos. No começo da trama, Bill Halleck está firmemente ancorado do lado dos “normais”: o trabalho de advogado, sua família, seu círculo social, seus hábitos… tudo a respeito do personagem reforça que ele é parte dos “gente fina”. Ao receber a maldição de Taduz Lemke — o velho cigano —, Halleck enfrenta questões que vão além dos problemas físicos causados por seu emagrecimento descontrolado: não somente sua saúde fica comprometida, como sua presença esquelética passa a ser motivo de repulsa das pessoas “comuns”.
Outro fator importante é o rechaço que o protagonista sofre de seu círculo imediato: toda vez que Bill confessa para sua família e amigos que acredita estar sumindo por ter sido amaldiçoado por um velho cigano, as pessoas ao seu redor acreditam que ele está louco. Assim, ao mesmo tempo em que seus quilos vão desaparecendo, Bill é arrancado de seu lugar de normalidade e colocado forçosamente à margem.
Uma vez rechaçado por seus iguais, Bill Halleck se vê também como um estigmatizado; em seu estado de magreza extrema, se percebe como uma aberração de circo. E à medida em que busca saber mais sobre sua condição e sobre maneiras de impedir o próprio desaparecimento, o protagonista nota que a maldição de Taduz Lemke se trata de uma vingança feroz; uma forma de fazer justiça pela cigana atropelada — já que a “gente fina” sempre protege a si mesma e trata os ciganos como subalternos.
A maldição de Lemke vem permeada de uma forte ideia de “gota d’água”; de um povo que sofreu todo tipo de discriminação e não espera encontrar justiça entre os “homens brancos da cidade”, como alguns ciganos se referem a Halleck e pessoas semelhantes no livro. O uso desta expressão na trama também é interessante: enquanto Bill e os “bons sujeitos” se consideram dentro da “norma” do mundo, a frase “homem branco da cidade” acaba colocando esta categoria de pessoa em um lugar de estranhamento, no qual há uma mudança de perspectiva — desta vez, o ponto de referência são os ciganos, e os “estranhos” são os gadjé.
Esta passagem encontra ecos nos estudos decoloniais, especialmente ao tratar do tema da alteridade: definir o outro é definir também a si mesmo, e o estabelecimento daquilo que é “normal” nunca se dá por acaso. Gayatri Spivak aponta como o projeto imperialista se ocupou de firmar o sujeito colonial como “o Outro”, ao mesmo tempo em que estabeleceu a perspectiva dos colonizadores como um ponto de vista totalizante-universalizante (SPIVAK, 2010). No microcosmo de Thinner, podemos levantar possibilidades a partir dessas categorias fundadas no imperialismo para pensar a subalternidade dos ciganos: enquanto Halleck percebe seu modo de vida ao início do livro como uma verdade absoluta, esta perspectiva vai se alterando à medida em que o conflito da trama se desloca para a margem. Inclusive, Bill só consegue começar a resolver sua maldição quando começa a de fato operar na margem: isto se materializa no personagem de Ginelli, o gângster italiano nova-iorquino que acaba por ser seu único aliado.
Para além do estereótipo comum associando ciganos à feitiçaria, King também explora outro lugar-comum ao tratar de uma figura específica: Gina Lemke, a jovem cigana armada com uma atiradeira. A todo momento, a beleza de Gina é ressaltada, assim como efeito que ela tem sobre os homens que encontra: ainda que sequer esteja pensando em seduzir os homens que encontra — na verdade, a emoção mais recorrente da personagem é a raiva —, toda aparição de Gina é traz a visão romântica de que ela é uma cigana misteriosa e voluptuosa, de que todos os homens ficam afetados por sua presença e sentem um enorme desejo por ela.
O uso do termo “romântico” aqui é proposital: esta figura da cigana que instila desejo remonta ao Romantismo, especialmente à obra Notre-Dame de Paris, de Victor Hugo — mais conhecida como O Corcunda de Notre-Dame. As passagens que remetem ao quão irresistível é Gina poderiam muito bem falar da própria Esmeralda, e compõem esse imaginário do povo Roma como uma gente exótica e ardente — mais um ponto dentro do eixo temor-fascínio que caracteriza o estigma cigano.
De acordo com os temas trabalhados em Thinner, Stephen King nos faz pensar em algumas questões: até onde uma vingança pode ir? O que ainda pode ser considerado como uma realidade absoluta perante os nossos encontros com o outro? Quando defino a mim mesmo como a norma, o que isso significa para aquele que é diferente? Por meio destas perguntas, o mestre do horror traça uma narrativa que vai além do conflito pessoal de Halleck e Lemke, englobando também os grupos aos quais pertencem. No fim das contas, vemos que maldições são, na verdade, ressentimentos. Se formos seguir a lógica de Thinner, podemos ainda pensar em como esses rancores podem escapar do nosso controle; ou mesmo em como essas maldições adquirem vida própria.
Referências Bibliográficas
GOFFMAN, Erving. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980.
KING, Stephen. A maldição do cigano. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.
SPIVAK, Gayatri Chakravorty. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.
*Giovanna Venturini é mestranda em Direito na Universidade Federal de Juiz de Fora, onde desenvolve pesquisa sobre o direito à educação do povo cigano. É também tanatóloga e pesquisadora na área da morte, vinculada ao LABÔ PUC-SP; nesta área, suas pesquisas se dividem entre patrimônio cemiterial e o impacto do tabu da morte na concepção de monstruosidade. Quando não está pesquisando e nem falando de defuntos, Giovanna é ilustradora, escritora e constante leitora de histórias de terror.
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Cleiton Lopes* Acredito que não é novidade pra ninguém que Stephen King não gostou nada do que Stanley Kubrick fez ao adaptar O Iluminado (1980) para as telas. Entretanto, a obra cinematográfica é uma pérola na história do cinema. É um título sempre presente nas mais diversas listas de melhores, sejam relacionadas ao terror ou…
Como King foi capaz de capturar o horror de ser queer
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