Este texto contém spoilers.

AVISO DE GATILHO: estupro, violência extrema.

Revenge (França, 2017) é um filme de ação e terror dirigido por Coralie Fargeat. Ele utiliza a fórmula clássica (e apelativa) do rape and revenge, ou seja, estupro e vingança, onde a personagem (geralmente uma mulher) é estuprada por um ou mais indivíduos, torturada, na maioria das vezes, e deixada para morrer. De alguma forma a personagem sobrevive e “volta” para torturar e/ou matar seus estupradores. Essa fórmula é bastante conhecida pelo filme I Spit On Your Grave (Doce Vingança, 1978).

Voltando ao filme, um homem casado e muito rico (Richard) leva sua amante (Jennifer) para passar uma noite em sua casa no meio de um deserto. Dois de seus sócios, homens também casados e muito ricos, aparecem no local antes do combinado. Durante a noite regada à bebidas e cigarros, Jennifer dança sensualmente para os homens, mas sem insinuar nada. Um deles, Stan, a quem ela chamou para dançar, interpreta erroneamente toda essa situação e, na manhã seguinte, quando Richard sai, ele estupra Jennifer.

O outro homem, Dimitri, acaba flagrando Stan a ponto de estuprar Jennifer, mas ele simplesmente fecha a porta, sendo condizente com tal atitude. Ao Richard voltar, pelo que parece os dois homens contam o que aconteceu, de maneira que parecesse culpa de Jennifer, por ter dançado sensualmente ou, como o próprio Richard disse, “ser gostosa demais, logo irresistível”. Com medo que essa situação saísse do controle e ela os denunciasse, ele oferece dinheiro para que ela fosse embora. Jennifer ameaça contar para a esposa de Richard sobre o caso deles e ele lhe dá um murro na boca. A partir disso ela sai correndo deserto afora, com os homens a perseguindo. Ao chegar na beira de um penhasco, Richard finge ter chamado o helicóptero para levá-la embora e a empurra do penhasco. Jennifer cai em cima de um tronco seco e pontudo, perfurando sua barriga.

Já temos o primeiro elemento do rape revenge: o estupro de Jennifer. Após ser empurrada do penhasco e perfurada pelo tronco, de alguma maneira ela consegue sobreviver, mesmo perdendo muito sangue. Conseguindo se livrar do tronco e ao ser novamente perseguida pelos homens, Jennifer consegue matar Dimitri. Na noite em que beberam, Richard pediu para Jennifer esconder uma droga chamada peiote, a qual ela escondeu dentro de seu colar. Richard também havia dito que uma vez alguém usou isso e cortou parte da própria perna, sem sentir dor. Sendo assim, Jennifer tem a ideia de fechar o buraco em seu corpo sob efeito da droga, acordando simplesmente curada. Esse é o segundo elemento do rape revenge: a “reabilitação” da personagem. Obviamente após isso ela vai atrás dos outros homens, numa perseguição recíproca e finalmente os mata, completando a fórmula: torturar e matar aqueles que a machucaram antes.

Assim como para muitos críticos, não me agrada o sub-gênero do rape revenge porque não vejo a necessidade de provar a força, inteligência ou crueldade de uma mulher só por ter sido estuprada ou violada, além de ser bem machista, é claro. Estranhei um pouco o fato de uma mulher dirigir um filme do tipo, além de várias cenas sexualizarem exageradamente o corpo de Jennifer.

Apesar de não concordar com o rape revenge, acredito que pode ser um sub-gênero que pode evoluir e partir para outras maneiras de ser representado, sem ser somente pelo estupro e, quem sabe, que pare de ser usado como elemento de uma fórmula cinematográfica. Compreendendo que a intenção desse tipo de filme é apelar, ainda assim tem como transformar essas situações de humilhação da mulher para algo mais construtivo. Um abuso sexual nunca é construtivo, pelo menos o rape revenge mostra que após isso só vem destruição. O que ele deixa de lado é mostrar que a destruição feita pela mulher abusada não a torna forte, muito menos empoderada. Após o estupro, essa é uma das coisas que mais me desagrada neste sub-gênero.

Explicitar esses elementos, refletir e construir um pensamento crítico em um filme não o diminui, na verdade agrega, desde que sejam feitas essas reflexões. Apesar dessas coisas, Revenge é um ótimo filme: o gore me agradou demais! Outros elementos que me agradaram foram a fotografia, a ótima utilização das cores quentes e saturadas do deserto em contraste com cores intensas quase neon e também sua trilha sonora. Eu recomendo àqueles que não tem problemas com esse tema e se encantam com banhos de sangue bem colocados, apenas não esqueçam de enxergar o filme além do superficial.